A solidão das mães de crianças com deficiência

Quando se é mãe de uma criança com deficiência, os desafios da criação são multiplicados


No Brasil, 23,9% da população possui alguma deficiência, de acordo com pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2010. Para o crescimento e desenvolvimento saudável de uma criança com deficiência, são necessários anos de sacrifícios e dedicação dos seus responsáveis que devem, além de lidar com a ausência de acessibilidade e políticas públicas, suprir as lacunas físicas e emocionais da criança, atender  às especificidades da deficiência e enfrentar os preconceitos da sociedade em geral.
Para atender aos seus filhos, é comum que os pais coloquem em segundo plano os seus projetos individuais. Mais comum ainda, é que as responsabilidades fiquem à cargo da mãe da criança e ela deixe de ser protagonista da própria vida. Para exemplificar as vivências diárias dos cuidados, mães de crianças com deficiência falam sobre a solidão experienciada cotidianamente.
 

Maira Oliveira

“É muito difícil a vida da mãe de uma criança que tem deficiência, o meu filho tem Transtorno do Espectro Autista (TEA). Hoje mesmo, fui comprar um sanduíche para ele comer, e todos ficaram olhando porque eu passei na frente, já que temos direito à fila preferencial. Então, ele passou mal, vomitou, todos olharam feio. Eu sempre sinto em uma obrigação desnecessária de ficar pedindo desculpas para as pessoas por alguma situação que aconteça, por alguma dificuldade que o felipe tenha, por algum comportamento diferente. Eu não tenho mais amigas, já tiveram pessoas que disseram que não queriam mais a minha amizade por causa do meu filho, do comportamento dele. Tem pessoas que acham que eu tinha que bater nele, que ele é mal educado ou mal criado, e não é nada disso. A minha própria sogra disse que o meu filho não é bem vindo na casa dela. Chamam o meu filho de violento, porque ele tem os repentes. Então, é bem complicado... Se eu vou em um passeio, conto apenas com meu marido e meus filhos, ninguém quer a nossa companhia”.


Lara Paulon

“A solidão da mãe de uma criança com deficiência é estar sempre sozinha, mesmo que em meio à multidão. Uma mãe especial dorme e acorda pensando em algo novo para agregar qualidade de vida e desenvolvimento para o seu filho. A mãe especial faz tudo que uma mãe típica faz, porém, sozinha. As pessoas se afastam devagar. A solidão não é concreta, ela tem amigos, família, esposo e, claro, filhos. Sua solidão está escondida em pequenas ações, quando alguém sem conhecimento diz que seu filho tem ‘problema’ e ela já está tão esgotada, que só olha e não responde. Essa solidão se encontra nos monólogos que têm com os seus filhos com deficiência, afinal, eles entendem, porém, não respondem.
Quando o corpo dá sinais de colapso, dores e a mãe especial não tem tempo para ir ao médico, ela não tem com quem deixar os filhos, ela precisa levá-los na terapia. A mãe especial não tem com quem contar, não tem para quem contar. Vítima não! Deus não castiga! A mãe de uma criança com deficiência é privilegiada por ter a oportunidade de ver, ouvir, sentir e ser o mundo de forma diferente. A solidão da mãe especial é consequência, mas, às vezes, é opção”. 

Luciana Soares

“Tenho uma filha de três anos, a Emanuela, que tem paralisia cerebral. A minha história é que, do segundo ao quarto mês, eu tive sangramento e, até então, eu não sabia que ela seria especial e nenhum médico disse que ela poderia ser. Depois que ela nasceu, houve uma suspeita de microcefalia, fizemos todos os exames e foi diagnosticado paralisia cerebral. A forma como o médico abordou a deficiência ela ao me contar, dizendo que ela era um presente de Deus, fez com que eu aceitasse com mais facilidade. Então, procurei tratamento e hoje ela está muito bem. Frequenta uma instituição especializada, começou a querer rolar, entender as coisas, a visão dela melhorou muito. À cada dia que se passa, tem acontecido muita coisa. Mas ainda tenho problema para lidar com outras pessoas que, ao invés de te ajudar e te fortalecer, são as primeiras a te colocar pra baixo, a questionar sobre o que você vai fazer com ela ou te culpar. Antes de ter ela, eu tive um aborto e engravidei oito meses após, então, as pessoas me culparam e isso quase me levou à uma depressão. Antes eu andava com o carrinho, depois, comecei a andar com uma cadeira de rodas para as pessoas olharem menos, e ainda tem o preconceito da própria família. Hoje, eu sou uma pessoa mais isolada, mas não totalmente, eu busco fazer novas amizades”.


Franciele Marcanzoni

“Eu tenho 35 anos, sou mãe de um menino que possui Transtorno do Espectro Autista e tem nove anos, e essa solidão é uma coisa muito presente na vida de todas as mães. De uma forma ou outra, na vida de uma mãe de criança especial, ela tem uma presença um pouco mais constante, porque tu tem aquela incompreensão, aquela falta de empatia das pessoas, da própria família, na escola. O primeiro ponto, é que eu sempre trabalhei, tinha uma carreira muito boa, um cargo executivo em uma grande empresa, mas parei de trabalhar porque meu filho precisa de um acompanhamento, tem uma rotina de terapias. E a única pessoa a fazer isso sou eu, não tenho uma rede de apoio, o meu núcleo familiar sou eu, meu esposo, o meu filho que possui autismo e um bebê de dois anos. Ser mãe de uma criança com deficiência é muito limitante, meu filho tem uma socialização difícil, então, eu não consigo deixar ele em uma brinquedoteca para fazer uma atividade, não consigo sair para jantar com meu marido, criar laços de amizade, porque meu filho tem dificuldade de ir em alguns lugares, se relacionar com outras crianças, ele tem uma seletividade para relacionamentos, então, acabamos ficando apenas em nosso núcleo familiar. Eu moro em Campo Grande há três anos, não tenho amizades aqui, não temos um círculo de amigos, nosso círculos somos nós mesmos, passamos por situações de complicações, os outros pais acham que ele é mal educado e tiram as crianças de perto dele, então, nós criamos alguns escudos. Sem perceber, é algo inconsciente, mas criamos esse desvínculo das outras pessoas. De certa forma, já estou designada a viver essa solidão. Hoje, o meu filho está muito melhor, mas ainda tenho essa dificuldade. Gostaria de voltar a trabalhar, mas tenho essa rotina com ele, e me sinto muito sozinha”. 

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Cinema em Campo Grande



A sessão adaptada contou com legenda descritiva, Libras e audiodescrição 


No último sábado (10), crianças, jovens e adultos puderam assistir uma sessão de cinema acessível com clima adaptado, legenda descritiva, Libras e audiodescrição no Shopping Bosque dos Ipês. Em parceria com o projeto Sessão Azul, foi realizado um momento de lazer para crianças com distúrbios intelectuais e seus familiares. O filme exibido para as crianças foi uma versão dublada e em 2D de "O Rei Leão".

A diferença entre uma sessão adaptada e uma sessão para pessoas sem deficiência, é que a sala do cinema permanece com as luzes levemente acesas durante toda a exibição, o som é mais baixo que o comum e a plateia pode andar, dançar, gritar ou cantar à vontade. Para garantir a acessibilidade para crianças com deficiência visual ou auditiva, a exibição teve legenda descritiva, Libras e audiodescrição. O valor do ingresso respeitou a legislação que garante direito à meia entrada para pessoas com deficiência.

O objetivo do projeto é que a sessão adaptada de cinema possibilite a ambientação das crianças, permitindo e encorajando as famílias a frequentar as sessões regulares, além de inserir esta atividade cultural na rotina, abrindo novos horizontes e possibilidades de lazer, funcionando inclusive como uma extensão ao trabalho terapêutico.

“O projeto teve início, após observarmos vários casos em que as famílias de pessoas com o Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) deixavam de ter um convívio social maior, por receio da reação do autista em situações que para ele, não seja tão confortável, como por exemplo, ir ao shopping, restaurantes, festas ou ir ao cinema. Além disso, identificamos que existem poucas opções de entretenimentos especializados voltado para estas famílias no Brasil”, afirma a psicóloga Carolina Salviano, uma das idealizadoras do projeto Sessão Azul e fundadoras da CapaciTEAutismo.

Profissionais capacitados irão acompanham e orientam às famílias, de forma que a sessão funcione como uma espécie de treinamento para as crianças na adaptação ao ambiente do cinema, e também para os pais, orientando-os em como lidar com as dificuldades de adaptação da criança ao novo ambiente, de forma que auxiliem diretamente para realizar e facilitar esta ambientação.

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